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Admitir indígena na ABL é admitir 200 línguas diferentes, diz Krenak
O mais novo imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL), o escritor, filósofo e ativista Ailton Krenak considera surpreendente a eleição dele para uma instituição que resguarda a língua portuguesa. Krenak será o primeiro indígena a ocupar uma cadeira na ABL. Ele foi eleito na noite de quinta-feira (5), com 23 votos. “A academia é de língua portuguesa, então, admitir o Ailton lá é admitir mais ou menos 200 línguas diferentes”, disse à Agência Brasil e Rádio Nacional.
Ailton Krenak se disse “muito surpreso” com a escolha de seu nome para a cadeira de número 5 da academia: “eu fiquei muito surpreso com a minha admissão neste lugar que, historicamente, nunca se abriu para a diversidade das culturas dos povos originários”. Um fato que confirma a surpresa é que o escritor não acompanhou a votação na sede da ABL. Ele estava em um táxi, quando recebeu a ligação do presidente da academia, Merval Pereira, com a notícia de que fora eleito. Para o mineiro de Itabirinha, na região do Vale do Rio Doce, o resultado da eleição rompe uma tradição na ABL. “A academia é uma instituição da lusofonia, da língua portuguesa, ela vigia o bom desenvolvimento da língua portuguesa. O Brasil é um país colonizado onde eu nasci, onde outros parentes nasceram de várias etnias”, diz. Direito na ConstituiçãoAutor das obras Ideias para adiar o fim do mundo (2019), A vida não é útil (2020), Futuro ancestral (2022) e Lugares de origem (2021), entre outras, Krenak é ativista socioambiental e pelos direitos dos povos indígenas. Um dos marcos na trajetória dele foi o discurso que fez na Assembleia Constituinte, em Brasília, em 1987. Representando a União das Nações Indígenas, ele subiu à tribuna de terno claro e pintou o rosto de preto em uma crítica ao que classificava como postura anti-indígena nas discussões parlamentares. Foi uma voz ativa para que a carta magna brasileira garantisse os direitos indígenas à cultura e à terra. A eleição para a ABL aconteceu justamente no dia em que a Constituição completou 35 anos. Passadas essas três décadas e meia, Krenak avalia que a Constituição Cidadã é fundamental para os povos originários. Ele ressalta o papel do Supremo Tribunal Federal (STF) para o cumprimento dos direitos garantidos pela lei. “Se não fosse assim, os povos indígenas teriam sido triturados”. ExemploPreocupado com o legado para representantes de comunidades indígenas, o novo imortal diz que não deixa uma mensagem, mas sim, exemplo.
Novas geraçõesA trajetória de Krenak inspira outros artistas de origens indígenas. Um deles é a ativista e artista visual Daiara Tukano. “Ele é um pensador de Brasil e sua flecha é afiada”, disse à Agência Brasil. Para Daiara, o acolhimento de Krenak pela ABL significa “muito mais que a chegada da primeira pessoa indígena nesse grupo historicamente fechado e dominado por homens brancos”. “Ailton tem a rara qualidade de ser um corpo coletivo de território e pensamento. Caminha acompanhando as histórias de muitos povos e embalado nas vozes dos rios, das florestas e da própria natureza. Sua produção é mais que literária: carrega a força da oralidade que bate na alma ao declarar que o amanhã não está à venda, que a vida não é útil e o futuro é ancestral”, disse a artista plástica, inspirada em nomes de obras do novo imortal. “Ele está espalhando sementes que conseguem segurar a terra no seu lugar, que nos permitem pensar em outros futuros”, conclui Daiara, que espera ver mais representantes de minorias eleitos para a ABL, para que a população brasileira “de fato, se reconheça”.
A eleição desta semana na ABL foi marcada pelo fato de ter dois candidatos representantes de minorias. O também indígena Daniel Munduruku ficou em terceiro lugar, com quatro votos. A historiadora Mary Del Priore obteve 12. A posse de Krenak ainda não está marcada, mas deve ocorrer em 2024, segundo informações da ABL. A cadeira número cinco, era ocupada por José Murilo de Carvalho, morto em 13 de agosto de 2023.
*Colaborou Cristiane Ribeiro, repórter da Rádio Nacional Fonte: Agência Brasil |
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